terça-feira, 2 de junho de 2009

MATRIX RELOADED - ESTÉTICA, ÉTICA E CONSUMO


Cine Pampulha (ano de 2003), meio-dia, uma fila imensa reúne jovens, crianças, adultos e idosos. Daqui a meia hora será exibida, pela primeira vez (espécie de avant premier) o filme "Matrix Reloaded" - segundo filme da aclamada trilogia dos diretores e irmãos Wachowski (baseados na obra Simulacro e Simulações do filósofo francês Jean Baudrillard).
Estou na fila, como os outros, ansioso por saber como o protagonista Neo (Keanu Reeves) irá libertar os seres humanos da vida simulada pela Matrix (espécie de IA, programa de computador, que aliena a vida humana para que estes, submissos, possam ser devorados/como alimento por um mundo dominado e realmente vivenciado por máquinas). E claro, ávido pela já comentada luta entre o protagonista e seu antagonista Agente Smith (Hugo Weaving) multiplicado em milhares de cópias.
Fazia um calor terrível, a fila para compra de ingressos andava a curtos passos, e eu já suava pela mistura da alta temperatura e ansiedade.
De repente uma figura adentra a enorme fila, chamando a atenção de muitos para si: um adolescente, em pleno sol do meio-dia, vestido com um largo e imponente sobretudo negro (assim como os complementos de toda a vestimenta), óculos escuros, cabelos com gel, botas. Estaria em nossa presença o protagonista "Neo"? Sim.
A resposta afirmativa é fruto de que ali, naquela fila de cinema, estava o personagem materializado em termos de mercadorias. Afinal, qual a motivação de se comprar um sobretudo negro em pleno calor brasileiro, e usá-lo ao meio-dia? Qual a motivação de se comprar botas para ir ao cinema, e pior, ir ao cinema portando óculos escuros? Aquele adolescente quer ser o "Neo", e para isso o que tivera que fazer? Consumir!
Em torno da obra cinematográfica "Matrix Reloaded" giram uma infinidade de mercadorias que vão do simples ingresso de cinema até ao sobretudo negro comprado pelos pais de um adolescente em estado de HIPNOSE-CULTURAL. Passada a onda hipnótica (e elas sempre passam, e muito rápido) fico imaginando aonde estará este sobretudo negro? Provavelmente em um lugar sombrio - o fundo de um armário (espécie de lixeira moderna).
Percebemos então como é tênue a relação ESTÉTICA/ÉTICA/CONSUMO realizando uma tríade muito poderosa a serviço da reprodução da engrenagem sócio-econômica hegemônica. Tomemos, com mais profundidade, o exemplo da obra "Matrix Reloaded":
Neo-Protagonista-Keanu Reeves APELO ESTÉTICO
Sobretudo negro, botas, óculos escuros (inclusive com uso noturno) APELO ESTÉTICO
Qualidades (elementos de sedução e convencimento)do Protagonista da obra como Força, Velocidade, Inteligência, Liderança, Sensualidade, Coragem APELO ÉTICO (SEJA COMO NEO - BOM É SER COMO O NEO - SE VOCÊ NÃO É COMO O NEO VOCÊ ESTÁ SENDO UM LOSER)
Criação das chamadas PSEUDO-NECESSIDADES: COMPRAR INGRESSO DE CINEMA, BOTAS, ÓCULOS ESCUROS, SOBRETUDO NEGRO, GEL PARA CABELO, AULAS DE ARTES MARCIAIS, DVD DO FILME, CD COM TRILHA SONORA DO FILME, CAMISETAS COM PERSONAGENS DO FILME, CADERNOS COM PERSONAGENS DO FILME, LIVROS E REVISTAS QUE TENHAM COMO TEMÁTICA ELEMENTOS DO FILME, PROGRAMAS DE TELEVISÃO QUE APRESENTEM ELEMENTOS DO FILME COMO ENTREVISTAS, REPORTAGENS, ESPECIAIS, DEBATES, CRÍTICAS - APELO AO CONSUMO.
Logo tem-se a REPRODUÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA do modus vivendi hegemônico!
E o que fazer quando a onda hipnótica se esvair com o tempo, porque como pseudo-necessidade ela tem por essência a instantaneidade? A indústria cultural reaparece na vida do indivíduo sob novas formas, dentro da tríade estética/ética/consumo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário