terça-feira, 19 de maio de 2009

O ESPETÁCULO DEBORDIANO

Gostaria de agradecer ao povo da cidade mineira de São João Evangelista, onde estive nos últimos três dias - pela simplicidade, hospitalidade, recebendo o amigo professor.
São João Evangelista se localiza no nordeste de Minas Gerais (micro-região do rio Doce), em direção ao estado do Espírito Santo, a 270 km de Belo Horizonte.
Estive na Escola Federal Agrotécnica de lá, que atende a cerca de 800 estudantes de nível médio, onde são preparados para o mercado de trabalho através do ensino profissionalizante (como de Sivicultura, Nutrição, Informática).
Lá em São João também tive a oportunidade de conhecer gente bacana, como o historiador Daniel (que dá aulas de História para os marinheiros do Espírito Santo), a nutricionista Paula (que atua em Pouso Alegre), e outros que fizeram do último final de semana uma experiência rica e agradável.

GUY DEBORD E A SOCIEDADE DO ESPETÁCULO
Debord foi um filósofo e cineasta francês, atuante nas agitações conhecidas como "maio de 68", e em sua produção intelectual destacamos o conceito de "sociedade do espetáculo", apresentado em 1967 na obra que leva o mesmo nome (e também em filme de 1973, de mesmo nome).
Em "A Sociedade do Espetáculo" Debord escreve de maneira livre, em aforismos (como Nietzsche fazia no século 19), e nestes ele aponta o que vem a ser o espetáculo: quando as relações humanas são permeiadas, mediadas, por imagens. Além disso Debord aponta o espetáculo como fenômeno produzido e reproduzido pelo modus vivendi capitalista, pelo sistema, a ponto de ser o espetáculo uma espécie de acumulação tal de capital que este é tornado imagem (vide publicidade, arte, meios de comunicação, indústria cultural).
Não há como fugir da relação entre o espetáculo debordiano e o conceito de alienação (já preconcebido por Karl Marx em obras como os Manuscritos Econômico-Filosóficos), visto que as relações humanas, midiatizadas, espetacularizadas, são relações reificadas (onde os seres humanos são tomados como objetos e não mais como sujeitos).
Citando o filósofo:
"A alienação do espectador em favor do objeto contemplado se expressa assim: quanto mais ele contempla, menos vive; quanto mais aceita reconhecer-se nas imagens dominantes da necessidade, menos compreende sua própria existência e seu próprio desejo. Em relação ao homem que age, a exterioridade do espetáculo aparece no fato de seus próprios gestos já não serem seus, mas de um outro que os representa por ele. É por isso que o espectador não se sente em casa em lugar algum, pois o espetáculo está em toda parte (...) O espetáculo na sociedade corresponde a uma fabricação concreta da alienação. A expansão econômica é sobretudo a expansão dessa produção industrial específica. O que cresce com a economia que se move por si mesma só pode ser a alienação que estava em seu núcleo original. O homem separado de seu produto produz, cada vez mais e com mais força, todos os detalhes de seu mundo. Assim vê-se cada vez mais separado de seu mundo. Quanto mais sua vida se torna seu produto, tanto mais ele se separa da vida. O espetáculo é o capital em tal grau de acumulação que se torna imagem."
DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo - comentários sobre a sociedade do espetáculo. trad. Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro: ed. Contraponto, 1997. p. 24-25.
O que é o homem separado do seu produto, e por consequência, separado de si mesmo? O trabalhador, o proletário, que é levado pelo sistema capitalista a vender-se, a vender a sua força de trabalho, em troca de um salário. É o homem que não possui mais uma relação subjetiva com seu trabalho, visto que este não mais lhe pertence, mas pertence ao burguês que o compra, e que lucra com este pelas vias da mais-valia (já que o produto do trabalho do trabalhador vale mais que o salário recebido por este, gerando lucros para os que lhe dominam e escravizam).
Ou seja, o capitalismo impõe aos homens um mundo de supervalorização do mercado e do objeto (das mercadorias). Aos seres humanos suas necessidades e suas pseudonecessidades (termo debordiano) só podem ser satisfeitas pela aquisição de mais e mais mercadorias no mercado, nunca fora deste, eliminando todas as formas de subsistência. E o que faz o espetáculo?
O espetáculo está ai para nos impor a reprodução desta ordem, nos impor uma certa paralisia, uma passividade perante um mundo dominado por objetos e mercadorias (estas sim vivas, afirmando-se enquanto fetiche). É a televisão, a publicidade, a indústria cultural (empregando termo frankfurtiano), as imagens que nos impõem: compre, compre, compre, ter, ter, ter, só assim será feliz...sua vida não será digna de ser vivida se não tiver um carro veloz como um tigre, um sabão que limpa como ninguém (ode a uma vida clean, quase higienizada), o amaciante que deixa a sua roupa mais leve, o aparelho que faz suco e lhe garantirá uma vida saudável, o desodorante que fará as mulheres gozarem só de cheirá-lo, a pasta de dentes que deixará o seu sorriso uma coisa irresistível, a margarina saborosa e saudável que reúne a família de manhã para um café feliz e radiante, etc.

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